sábado, 22 de novembro de 2008

O respeito à Lógica do Jogo e a Hierarquização de Princípios

Ao iniciar a construção de um Modelo de Jogo (MJ), o treinador de futebol deve ter claro quais são todos os elementos que farão parte do mesmo. Quase que simultaneamente, ele deve ordenar esses elementos em ordem de importância, ou seja, criar uma estrutura hierárquica. Porque tão importante quanto a quantidade de variáveis e, conseqüentemente de possibilidades que um MJ contém, é a forma organizada (podemos dizer também ordenada) com que essas variáveis se manifestam. Para exemplificar, podemos imaginar uma equipe que entende o movimento coletivo necessário para realizar pressão na linha 5 (pressão em bloco alto), porém seus atletas não tem muito bem definidos quais os referenciais que ativarão essa busca pela bola (se um passe para trás ou a bola em determinada zona do campo) fazendo com que a equipe fique em estado de “confusão organizacional”, com os atletas tomando decisões que não respeitem à mesma orientação, aumentando a possibilidade do adversário livrar-se dessa situação pelos espaços gerados.

O neurocientista Antônio Damásio, em seu livro “O Erro de Descartes” (1994) propõe alguns conceitos interessantes para essa discussão. Concebendo a razão como sendo baseada na seleção automatizada, ele nos dá a seguinte solução:

1) se a ordem tiver de ser criada entre as possibilidades disponíveis, nesse caso elas terão que ser ordenadas;

2) se tiverem que ser ordenadas, então são necessários critérios;

3) os critérios são fornecidos pelos marcadores-somáticos, que exprimem, a qualquer momento, as preferências cumulativas que recebemos adquirimos.

Portanto, tendo várias possibilidades elas tem que ser ordenadas, para isso são necessários critérios que são fornecidos pelos marcadores-somáticos, entendido? Até certo ponto sim, mas o que me define os critérios que servirão de base para essa ordenação? O primeiro e essencial critério é colocar a LÓGICA DO JOGO como epicentro do processo de treino. Em nenhum momento pode-se subestimar a lógica do jogo como balizadora da construção do MJ. Como podemos acompanhar na figura abaixo, temos os Princípios Estruturais e os Princípios Operacionais se correlacionando, porém sempre num nível subjacente à lógica do jogo devido as importantes funções que eles têm como ferramentas para cumpri-la da maneira mais eficaz possível.




Figura 1 – Nível primário de Hierarquia para construção do Modelo de Jogo

Para Amieiro (2005), ao se referir à organização defensiva, pensa que o todo, as relações a privilegiar entre as partes que o constituem (os jogadores), e as tarefas a realizar por cada uma delas isoladamente, serão diversos em sua manifestação, de acordo com as referências que se consideram e a respectiva hierarquização (estabelecimento de prioridades). Nesse trecho do referido autor, vemos claramente uma referência à necessidade de ordenação de princípios na estruturação do processo defensivo e como só assim é possível que um grupo de jogadores atue como uma equipe, com interdependência e inter-relação no jogar. Também pode-se interpretar que o autor está referindo-se à hierarquia no nível apenas dos Princípios Estruturais e Operacionais e a relação entre os dois, não considerando a relação de ambos com a o cumprimento da lógica do jogo.

Para estruturar a hierarquia é necessário estabelecer critérios, prioridades, que serão definidos a partir do conhecimento que o treinador tem sobre o jogo, o que ele considera fundamental sua equipe realizar para vencer partidas. Jamais será garantia de vitória ter melhor amplitude ou bascular de forma mais equilibrada que o adversário, porque os princípios só ganham significado quando estão a serviço do cumprimento eficaz da LÓGICA DO JOGO. Nela se encontram as explicações para as vitórias e as derrotas e o profissional do futebol que compreendê-la integralmente, provavelmente não mais perderá partidas (até que um segundo profissional realize o mesmo).

Referências Bibliográficas

Amieiro, N. (2005) Defesa à Zona no Futebol: Um pretexto para refletir sobre o jogar ... bem, ganhando! Edição do Autor. 2005.

Damásio, A. (1994) O Erro de Descartes. São Paulo: Companhia das Letras. 1996.


Leandro Zago - CIEFuT